A mão invisível
da perseguição

Ilustração

Por João Ivo Caleffi:

O cidadão de bem que se ventura em participar da vida pública tem que estar preparado para enfrentar dissabores, adversidade e até mesmo perseguição, as vezes por meios de mãos invisíveis ou quase.
Quanto mais correto e honesto for, em suas ações e praticar atos coletivos, em defesa do bem comum, mais sofrerá. Desperta a ira de muitos.

Parece contraditório dizer isso em um tempo de tantos desvios de dinheiro público, de falta de amor, de falta de dedicação a coisa pública, a coletividade, ao bem comum, ao bem coletivo. Mas é necessário dizer, pois justamente num tempo sombrio como esse, sem referência do bem, afasta-se, muitos dos que poderiam ajudar a construir o bem público, o bem comum, ser referência boa para o país. Afasta a energia boa, humana, o movimento bom.
Não há saída sem a participação de todos e do respeito a essa participação ativa. Se de alguma forma política, jurídica, econômica ou outra, afastar as pessoas da participação, ai inibe a construção de uma saída, frustra construção de um país inteiro.
Todo cuidado, sensibilidade e lucidez, são imprescindíveis, neste momento. Toda e qualquer forma de exclusão, desta participação do cidadão, tem que ser refutada. Senão tudo vem a baixo. É preciso pensar sobre isso.
Aristóteles, no século IV a.C, dizia que: “Um cidadão integral pode ser definido por nada mais nada menos que pelo direito de administrar a justiça e exercer funções públicas.” Para o filósofo grego, se preocupar com questões públicas, era tão fundamental, que chega a decidir sobre se é ou não um cidadão, é critério definidor de sua situação, na sociedade grega daquele tempo.
Hoje, parece ser muito mais difícil, para a pessoa que de fato quer ser um cidadão pleno. Primeiro porque os meios de controle ideológico são demasiadamente eficientes, a manipulação das mentes é extremamente eficaz e sutil. Desvia muitas pessoas de boa-fé, levando-os a seguir caminhos que acham que são seus, mas não são, é a força da ideologia no seu sentido negativo da palavra, que faz uma mentira parecer verdade, uma falsidade parecer real, uma miragem parecer evidente.
O pior é que muitas vezes, o individuo, sai por ai defendendo com unhas e dentes essa posição, esse entendimento, como se fosse seu entendimento, sua ideia e de seus interesses, mas na verdade é contra si e contra sua liberdade, há uma falsificação da realidade, é a escravidão parecendo como liberdade. As verdadeiras forças que determinam o movimento, permanecem invisíveis para ele. É uma consciência falsa.
Quando consegue romper, superar, essa situação, ai vem a perseguição, muitas vezes de forma sutil, por meio de mãos invisíveis, mas também as vezes de forma muito concreta, visível, por meio da política, jurídica, econômica e outras espécies de exclusão, isolamento, ostracismo, difamação e outras pequenas formas de maldades, de destruição do outro como agente político, como pessoa, com cidadão. É o tirar do jogo.
Burocratizar a vida das pessoas, de vários jeitos, para que não tenha tempo, tranquilidade, paz de espirito, recursos, para poder participar da vida pública, é outra estratégia de perseguir e anular o outro. Sofisticou o modo de agir, invisíveis ou não, de exclusão. As vezes imperceptíveis, parecendo ingênuo, quase natural, sem interesse, sem maldade, intencionalidade, mas vem carregado de esperteza e sagacidade. Quem nunca viveu isso?!
Na Grécia, na Cidade de Atenas, no ano de 460 a.C a 395 a.C, século V, viveu Tucídides, ele provavelmente, nas praças e ruas de Atenas de sua época, já discutia, angustiado, criticamente, sobre a participação nas atividades públicas, rompendo com a ideia de que o debate político, das ideias, democrático, dos problemas da cidade, atrapalhava, o bom andamento das coisas, ele vai contra essa ideia e diz, que todos devem participar, que ninguém pode ser excluído do debate e da construção da cidade, ele diz: “Olhamos o homem alheio às atividades públicas não como alguém que cuida apenas de seus próprios interesses, mas como um inútil; nós cidadãos atenienses, decidimos as questões públicas por nós mesmos na crença de que não é o debate que é empecilho à ação, e sim o fato de não se estar esclarecido pelo debate antes de chegar a hora da ação.”
O sistema de controle sempre existiu, mas atualmente, ele é muito mais sutil, a mão invisível do controle e da perseguição se aperfeiçoou muito no nosso tempo.
Estamos cada vez mais longe desses gregos ousados, desafiador, corajosos, denunciador de qualquer forma de controle e de perseguição do cidadão, da democracia, da justiça, de dissimulação, o critério era o bem da polis, a participação do cidadão na vida da cidade. Temos muito o que aprender com eles.
Temos que procurar um jeito de romper com a hipocrisia reinante em nosso tempo. É urgente superar, vencer a mão invisível do controle e da perseguição. Temos um país a construir.
_______________________
(*) João Ivo Caleffi é ex-prefeito de Maringá

Advertisement
Advertisement