“Cachorros de polaco”
vigiaram a UPT

Gansos

De Laércio Souto Maior:

Um ano após a inauguração da Universidade Popular do Trabalho (UPT) com pompa e circunstância na presença de autoridades, delegações estrangeiras e representantes do movimento sindical e popular do Paraná, o recém empossado governador Roberto Requião, que sucedeu Álvaro Dias no governo do estado em 1991, surpreendeu a direção da nova instituição determinando a demissão das equipes de serventes, zeladoras e guardas, que além da segurança interna e externa, mantinham seguras, limpas e arejadas as amplas dependências da UPT, que surgiu no firmamento político do Paraná para abrigar um projeto revolucionário, como nunca tinha ocorrido antes, administrado em cogestão entre técnicos da Secretaria do Trabalho e Ação Social, e lideranças sindicais e populares, numa prática libertária, pluralista e democrática, descolada do partido que estava no poder (PMDB).

Obviamente, como coordenador-geral da nova instituição, fiquei muito preocupado com a medida inesperada do governador e com a perspectiva dos valiosos e novos equipamentos (filmadoras, câmeras fotográficas, aparelhos de som dos auditórios, máquinas de datilografia — ainda não existiam computadores nos órgãos do estado) e uma Kombi serem roubados, bem como os pertences dos militantes que ficavam nos alojamentos onde eles se hospedavam. Uma lenda brasileira diz que as coisas ruins sempre acontecem nas sextas-feiras, pois não tinha como pedir socorro no sábado e no domingo quando não havia expediente nas repartições públicas. O problema na UPT aconteceu justamente numa sexta-feira. O que fazer?
Tenso, sentado na minha sala, matutava como resolver o problema naquela emergência quando surgiu sorridente o Agustinho Bukowski, coordenador administrativo da Universidade Popular do Trabalho, que tinha exercido o cargo de presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Paraná (Fetaep). Foi chegando e já falando a respeito da situação de insegurança e constrangimento que todos que trabalhavam na instituição estavam expostos a partir do ato insensato do nosso governador. Sem titubear, Agustinho se dirigindo a minha pessoa, disparou: “chefe (era assim que ele me chamava afetuosamente), fique tranquilo. Já achei a solução para o problema de segurança e vigilância da nossa UPT. Amanhã cedo você tomará conhecimento da solução de emergência que encontrei”. Sem mais delongas, se despediu e quase correndo sumiu no corredor que atravessava todo o setor administrativo da UPT. Pensei comigo, “que danado o Agustinho vai aprontar?”. No outro dia, desci do ônibus do Tarumã próximo ao Detran e fui apressado, curioso para ver a solução encontrado pelo tranquilo coordenador administrativo. Quando adentrei o portão principal da UPT avistei o Agustinho Bukowski sorridente, caminhando na minha direção.
Depois de cumprimenta-lo, indaguei: “E daí, Agustinho, tudo bem?”. “Tudo ótimo chefe, me acompanhe”. Com passadas largas contornamos o grande estacionamento que abrigava os carros dos usuários e andamos em direção à área do fundo do prédio da UPT. Lá chegando, para minha surpresa, avistei um cercado e dentro do mesmo vários enormes gansos. Agustinho, eufórico, explicou: “Doutor Laércio, esses gansos são os famosos ‘cachorros de polacos’ que vão vigiar e manter segura a UPT melhor do que os guardas de segurança que o Requião demitiu”. E arrematou: “Podemos dormir tranquilos, em paz, que nada será roubado da UPT pelos marginais que levarão boas carreiras se tentarem”. Lição da história: como bom descendente de poloneses, o nosso Agustinho Bukowski encontrou solução salomônica ideal naquela circunstância e emergência. Anos depois, acompanhei muitos outros casos em que autoridades utilizaram os gansos como vigilantes em delegacias e outros locais públicos, no Paraná, no Brasil e até na China.
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(*) Laércio Souto Maior é escritor, historiador e jornalista pernambucano, radicado em Curitiba. Publicado originalmente na coluna História & Política, na edição impressa do jornal “O Diário do Norte do Paraná”, do dia 5 de agosto de 2017

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